01 dezembro, 2008

das coisas que [ainda] não vi



tenho um certo fascínio pelas novas imagens, pois sei que as coisas mais belas eu ainda não vi, por isso eu ando com olhos sempre cerrados vasculhando todo pedaço de qualquer coisa a minha volta, pra então me perder em alguém na praça, num encontro, numa criança brincando sozinha, numa folha seca dançando no vento, numa cena que ninguém repare.


eu vejo beleza em tanta coisa besta. e dessas besteiras eu construo o meu jardim. pequenas coisas cotidianas, flores 'roubadas' da vida dos outros, pétalas que deixam cair.. as coisas mais bobas e belas que possam existir, secretamente.


é assim que a minha mente dispara, vai na minha frente e às vezes quase consigo alcançá-la, porque ainda não sei tocar tão bem naquilo que ainda não foi.


mas até que deixo que meus olhos me limitem um pouco o sonho, porque gosto de me surpreender com novas pétalas. talvez não houvesse tanta beleza se a mente já tivesse captado a mesma flor em alguma outra imaginação.


eu tenho um sonho em especial, uma flor que meus olhos esperam enquanto me distraio nessas pétalas, e digo, sem me assustar, que nem vou me lembrar do meu jardim e das coisas belas que já colhi, quando os meus olhos acharem o que aguardam.



[Mateus 24:29-30]

07 agosto, 2008

sinais




gota a gota. eu sinto pingar dentro de mim no mesmo compasso. cada uma delas parece anunciar uma mensagem secreta, mesmo que num tom baixo, uma a uma. é preciso parar tudo pra ouvir. é assim que começa.

de repente, não muito mais que isso, outras aparecem pra confirmar o que a primeira tentava explicar. começa um novo ritmo e a mensagem ousa mais à nossa frente. e o volume aumenta quando você se concentra e esquece os outros sons. e você parece finalmente entender que aquela seqüência de tons no telhado te ordena.

abra o guarda-chuva... pegue o cobertor... tire as roupas do varal...

a chuva logo vem.


a ordem é se preparar.


[e eu já sinto o friozinho na barriga]



"bem-aventurados aqueles servos,
os quais, quando o Senhor vier, achar
vigiando! em verdade vos digo que se cingirá,
e os fará assentar à mesa e, chegando-se, os servirá." [lc 12:37]

02 agosto, 2008

o senhor dos sapatos

a cada passo eu tento prever o seguinte, como se a estrada fosse sempre tão plana e homogênea, só porque fui eu quem escolheu e comprou esses sapatos. como se coordenar o movimento dos meus pés fosse suficiente para impedir o perigo logo a esquina. mas ao dobrar outro mundo.
e assim mesmo sempre impelida a ir com cautela e olhar sempre os dois lados antes de atravessar, como se apenas isso bastasse.
os machucados que carrego a cada passo superado e pegada deixada por misericórdia aos segundos passados, não me trazem aos ouvidos o aviso que impede o tropeço, a queda. mesmo que seja apenas mais um de tantos que houveram. mesmo que seja só mais no mesmo lugar.
tantos sinais ao redor que nada me comovem. eu movo meus pés com destreza e harmonia que copiei de alguém. seguindo como quem sabe aonde vai, mas ninguém sabe que sigo os caminhos que se atreveram a minha frente, na fuga de não me manter parada e no risco de não ir a lugar nenhum. quero apenas que me vejam passando.
e dentro de mim eu sinto o quanto custam meus calos, na tentativa de dançar, de saltar, de correr. mas não saio dos mesmos passos errados e pesados. errados, pesados e doloridos, que em mim eu acredito que não há caminho que me compense uns sapatos confortáveis. mas eu não paro de dançar. que me vejam passar. que me vejam.
parece que embora ande nunca saio do mesmo lugar.

eu ouço rumores de alguém que decora meus movimentos e que quer me trazer uns sapatos bonitos e leves para que eu não pare. mas dizem também que há um caminho [o caminho] a ser percorrido até lá, mas que há um acompanhante oferecido gratuitamente pra quem decide ir encontra-lo. imagine só... gratuitamente. e ele te leva nos braços.

“ a estrada do justo é como a luz da aurora,
que brilha cada vez mais até ser dia perfeito” [pv 4:18]

29 junho, 2008

novas formas na retina

eu tinha uma boneca. não lembro ao certo quando foi decidido que ela entrasse em minha vida, nem como, mas lembro que foi uma amiga inseparável durante muito, muito tempo. eu lembro cada detalhe que a formava e de como me era querida, uma amiga tão próxima, mas que nunca ousara descobrir seu nome e nem ela também a dizê-lo. ela tinha longos cabelos lisos no início, cabelos que eu amava e nunca consegui ter. mas ela pôde usufruir disso por bom tempo. já que era ela a sortuda nesse caso, eu me contentava em ser feliz por ela, ela merecia o cabelo mais que eu. tinha olhos redondos, azuis, grandes e tão penetrantes, que nenhum fabricante ousaria em qualquer simples bonequinha de pano. e ela não era qualquer uma, nem somente simples, eu sempre soube o seu valor, desde o primeiro dia.
com o tempo eu resolvi crescer, meio que obrigada no princípio, mas depois foi realmente preciso, por motivos e coisas que não conferem nessa história. quem sabe outra hora eu te conte, pois hoje você precisa dormir cedo.
num tempo que me durou apenas alguns centímetros a mais, nela este mesmo tempo foi ainda mais cruel. para ela lhe durou uma roupa mais bufenta e amarrotada, um olho a menos, alguns remendos nas suas costas ao tecido que sedia aos dias, deixando-a aparentemente cada vez mais frágil. nessas costuras nunca vi um só pingo de sangue escorrer, juro. ela era na verdade sempre tão forte. e os seus cabelos ganhavam espaço no ar, agora tão cheios, nem eram mais lisos e pareciam ter encolhido. não eram mais como antes. achei justo, pois nem eu mais o era.
mas em mim, te digo, permaneceu sempre tão linda. não pela sua primeira imagem que era ainda tão viva na lembrança, mas pelo que ela significava pra mim todo dia, há muito tempo. eu nunca forcei achar-lhe tão bela, nunca, eu simplesmente achava, mesmo com o tempo e as coisas que o tempo lhe rendeu. eu a interpretava assim.
linda. como a gente vê alguém e acha. é a nossa forma de interpretá-la também. todo mundo costuma interpretar as pessoas ao seu jeito. às vezes até a gente sabe que aquela pessoa não é e que a maioria não arriscaria tal adjetivo, mas a gente acha simplesmente. tem gente que nós nem achamos, mas que coisas simples nos remetem a novas interpretações. é preciso estar aberto pra isso também.
de tudo o que ela me trouxe, o que guardo ainda mais forte nas minhas recordações é isso: saber interpretar as coisas, os textos, as pessoas e principalmente as bonecas. não importa o que a fila inteira ache, se o meu olhar aponta novas cores. só a gente sabe o efeito que causa na gente o que a vista aponta. quem mais verá com os olhos que vi? como não sei, continuo a descrever como ela era. pra que se deixem ver com os mesmo olhos que vi e saibam interpretar mais bonito.


só sabe mesmo quem vê. quem quer vê.

24 junho, 2008

mateus 7:7



estava à porta. sim, como deveria sempre estar. ainda não ousara bater, mas parou, suspirou fundo e bonito, se deliciou com a certeza de enfim estar no lugar certo.


tantas estradas já tinham lhe apontado o caminho, das quais olhava-as com os olhos apertados, até onde sua vista poderia alcançar, para então prever o fim que lhe caberia. e este foi o caminho onde seus pés descansaram.


agora sim tinha achado a porta. chegou a olhá-la por completo e se sentiu feliz assim tão pequeno. sempre sentiu certo fascínio por essa imagem vista por cima e não passou em momento algum em sua mente que fosse isto intimidante. pelo contrário, era tão acolhedor.


e ali, à porta, viu suas mãos tão calejadas sentirem alívio. por estarem limpas agora poderia tocar, poderia então bater. e batia como se já tivesse alcançado o que até então se escondia ali atrás. seu coração sabia o quanto tinha esperado e esperaria mais se preciso fosse, ao tempo que o caminho percorrido lhe preparava o sabor.



e bateu, bateu, bateu.. nessa porta que se abriria.


'contudo, um poema,

tua obra de arte,

destacasse à parte,

numa cruz vulgar'

[te vejo poeta - joão alexandre]

18 maio, 2008

aos espelhos

[os de dentro ou de fora]

ao que parece seria um bom sistema, ocorria um pensamento ligeiro antes de cada expressão. era o que tinha a palma da mão e se contentaria por muito tempo nesse ensaio prévio, do que ainda não sabia o quê, mas que esperava. e se de fato esperava deveria sim preparar-se, era a forma de materializar a sua fé. se sentia injusta esperar apenas, sentada quem sabe, e invulnerável. mas ela não entendia isso ainda muito bem, assim como você agora ao que eu digo. e fazia essa mesma cara de desconfiança.

e é disso que tenho me aproveitado.

ela corria ao espelho e montava seu script, com o tom que caísse melhor. e do outro lado a imagem refletida era aos seus olhos a que já vivia o que ela ainda esperava.

esticava as mãos e quase podia tocar. quase.

o espelho era em sua mente e lá ele mora até hoje. era dentro dela, mas ela estava do lado de fora. ainda.

mas ele não reflete, como os espelhos comuns, pois comum não o é.

era tão condizente com o que não vivia, como tão difícil definir o que é.

a vida fingia correr naturalmente, disfarçada de coração batendo à intervalos constantes, mas sabe-se aqui que a vida porque assim parecia andar, não seria ela própria também personagem. o coração acelerava.

e a vida, como bem sabe, é aquilo tudo que você pode ver ao redor, é o que você sabe e até onde sua mente consegue alcançar. mas vou te contar... há muito de vida além, posso te garantir aqui. secretamente.

e o lado de cá, a vida de fato, perdia cada vez mais a sua graça, pois no espelho se refletiam novas imagens que via a si própria já a desfrutar. não essa que vivia, mas aquela do outro lado.

e já não se contentava por sonhar, pois a vida do lado de lá a atraía ardentemente, como essas palavras. mas pôde então entender a mensagem, que poderia então alcançar sendo ela própria o reflexo, não o contrário como tinha pensado até então.

ela já não só via um espelho, como agora já buscava ser. pois nunca o é por completo, mas isso já é o bastante, acredite.

então pôde tocar. finalmente.

e já sabia o que esperava. e o que esperava por ela.

e ainda não mudou toda a vida, pois sabe e consegue ver muitas coisas. a sua vida é grande demais. mas quer mudar a vida de alguns falando de um tal espelho, mas falará de uma forma mais simples.. da próxima vez.

onde estão os espelhos?

04 maio, 2008

colheita

você tem o mundo, muitas coisas e algumas mãos. as suas e outras próximas que te completam.você tem muita coisa ao redor, além das já casuais, e às vezes quase nada nas mãos. mas não faça essa cara de descrença agora, se deixe entender mais tarde e agora só escute. eu explico.

pois bem, e quando quer pegá-las, suas mãos - as duas ou algumas - não parecem o suficiente. você só não sabe como crescer e apanha-las, nem como diminuí-las ao tamanho da palma da mão... mas você tenta. e consegue colher algumas, as possíveis, as que tiverem ao alcance, ou as que você quer somente, e tenta ajustá-las nessa página.

e de repente elas crescem, tomam algumas proporções imprevistas... e das coisas que você acha ser insuficiente, você tira de lá exatamente o que precisa pra alcançar as demais.

e é da ausência do que dizer que vejo minhas mãos sem calos, vejo minha mãos caladas, sem coisa alguma. e no fim você vê que só precisa aguardar um pouco, colher o que pode, soma-las a você e crescer com elas... de pouco em pouco... na medida certa.

e isso foi o que eu alcancei hoje.

eu junto minhas mãos às suas e podemos alcançar o distante.

se existe uma fórmula, talvez seja essa.

27 abril, 2008

como páginas de um livro

difícil esperar a hora certa. difícil saber se a hora certa é mesma que o ponteiro marca no nosso relógio.. com algumas horas adiantadas.

e o infinito que se pensa ser a hora seguinte... e o minuto seguinte que nunca chega.

o final que nos cabe, que nunca se sabe e que se espera infindavelmente.

[o dia chegará e todos verão]

e saber depois de tudo qual a hora que a gente espera acontecer... qual o momento que acordamos todo dia pensando que será ali, naquele dia.. qual o dia marcado no calendário, que ansiosamente é folheado e todos os dias feito uma nova recontagem do quanto falta, do quanto ainda doerá... qual o segundo que pensamos que irá mudar a rota... pra sempre[??].

mas depois de um tempo que das esperas - de tantas delas (umas válidas e outras não) -, se vê que as coisas não mudam muito e as metas que traçamos são cada vez mais longínquas, pra que se tenha em quê se agarrar com tempo de validade cada vez maior.

até chegar ao ponto, onde não se tenha mais nada a esperar depois daquilo.

é como um livro, onde você espera exasperado pra terminar cada página e que por mais que você não agüente mais até chegar a próxima, o que importa de verdade é ultima e que depois dela só restam espaços brancos, conseqüentes daquele final. é quando o tempo e o espaço se interceptam de novo. um caminho até o final. você entende?

eu nunca gosto de pular as páginas e ver o que será depois. eu espero, com o coração apertado, mas espero. é a esperança com validade maior... a maior esperança é do que irá acontecer na ultima página.

eu já não espero o tempo da virada brusca... eu não espero o que um dia vai passar, pois não valerá tanta tempo aguardando... espero o ponto final do que se pode esperar e o que finalmente abrirá o caminho pra onde não se precisará mais de esperas.

é na linha final que meus olhos descansam. nas coisas eternas, não nas passageiras. na ultima página do livro.

e às vezes você está tão distraído que nem percebe e já é o ponto final. mas ainda vem o espaço em branco e por isso vale a pena esperar. garanto.




eu olho para o céu já são tantos os sinais
não sei pros meus dias ou pros meus filhos
pra todos os efeitos eu vivo preparado e em paz
eu to esperando a tua volta’

22 abril, 2008

alguém diferente

Das diferenças, soube sempre, era o que a atraía. Quando resolveu buscar um ser para ser, foi da estranha arte de inventar, procurar o que até então não se havia pensado, nem sido, que buscou. Da forma de se vestir, de falar, sobre o que falar, escrever... não quis nada usado. Quis algo limpo, novo, seu.

Do amo fez também suas idéias.

Das dores, cores, livros, encantos..

Mas de nada havia isso de novo, pensou. Mesmo que ousasse um novo movimento, nada que fizesse fugiria dessa imagem enquadrada, preconcebida. Uma mesma fôrma. Talvez tudo já tivesse sido pensado antes, não se havia nada mais a se criar, até porque já se faz tanto tempo desde tudo.

Logo ela, que fugia de qualquer imagem tachada, achou que lá de cima talvez todos não fizesse lá muita diferença. Por mais que todos se podassem[ e se podam], reparassem os excessos [e reparam], seriam todos de uma mesma fôrma. De fato talvez não tivesse nada de muito novo pra apresentar.

Mas um dia ela encontrou alguém diferente. E foi ele o esperto que pensou antes de todo mundo. E realmente, o melhor já tinha sido inventado.

14 março, 2008

das dores



não há formula, não tem como te dizer é isso ou aquilo, faça assim ou de outro jeito, a não ser que você tenha realmente nascido pra coisa, o que, de fato, iria me incomodar um bocado. mas não, não ache que isso é um problema [não mais], pois tenho levado, acredite, e é o que definitivamente também tem me impulsionado.

tenho aprendido.

é certo que existe todo um esquema de processamento e autocrítica que diria até ser constante, confesso, mas só dói no momento anterior da aceitação, nesse caso quando isso ainda se faz problema e depois, bom, depois começa a lavagem, é faxina diária na alma, é limpeza da poeira na estante de livros e ás vezes até resulta em algumas mudanças radicais no roteiro, o que é bem aceitável nesses últimos dias. mas o momento de dor é que é realmente decisivo, pois é ali, ali exatamente que a gente tem a noção da coisa... entendeu o que falei sobre ter jeito pra coisa? eu não tenho muito jeito pra ela, porque ter em outros termos seria também aceitar, e eu não aceito. e você vai até dizer que é uma válvula de escape ou um jeito de ser otimista, uma forma de não sair perdendo ou só uma pessoa sem vontade de se dar por vencido e guardar o aprendizado pra mais tarde.

é tarde.




13 março, 2008

notícia de uma lembrança

' durante algum tempo fiz coisas antigas

como chorar e sentir saudade da maneira

mais humana possível: fiz coisas antigas e

humanas como se elas me solucionassem'

[caio f. abreu]


lembro que foi quando a história começou realmente a fazer sentido pra mim, lembro porque foi no mesmo momento em que parti... ou foi tu que partiu
? pois só lembro da distância que crescia apressada entre nós dois, com urgência em acabar uma possível história feliz [não que nossas vidas não sejam, era só uma possível] ou um simples gesto involuntário ou palavra vaga que precisasse de algum tempo pra ser decifrada, nada que prendesse demais, nada que implicasse numa mudança na rotina, nada que impedisse alguém de partir. mas de tudo o que ficou o que me mais me dói é que eu não sabia que uma ação, simples que fosse, iria fazer tal diferença um dia, inda mais se esse dia ocupasse todos os agora’s da vida. se eu soubesse da reação de cada ato, não faria deles uma lembrança tão dolorida. e eu lembro como era tão fácil jurar a fidelidade eterna e que envolvido na situação um de nós jurou nunca partir, nunca se mudar, nunca ficar longe, nunca nem pensar distante e que o outro jurou cumplicidade e também fez muitas outras juras em nome da amizade, mas não mencionou nada sobre distância, talvez porque soubesse. eu lembro de tudo, de cada detalhe, só nunca consigo lembrar quem foi o quê dessa história, talvez porque tenhamos realmente levado a sério essa coisa de cumplicidade e a gente acabou se confundindo pra sempre. e penso nisso agora porque descobri que quem jurou não partir é justamente esse que se foi e a esse não se deve mais o direito de promessa ou ao outro o direito de não partir. só preciso saber se te lembras e aprender algo realmente verdadeiro sobre não se prender.


[estou deixando as palavras fluírem, escorrerem como a maquiagem que tiro pra dormir, não ter ainda achado uma linha certa eu tenho achado super incomodo, mas espero que você vá achando graça]

29 fevereiro, 2008

máscara



já que é assim, deixa então que eu mesma escolho a minha máscara. me parece tão cruel esse sistema, ninguém ser quem parece ser, mas faço diferente. já que não sou eu tão fútil assim, mesmo querendo não ser tão comum, mas sendo condicionada a esse jogo, farei jus a minha escolha. quero aquela máscara ali, aquela tão parecida comigo que até me confunde, eu arranjo a minha forma de fugir desse quadro taxado. pego e coloco e até dou uma olhadinha no espelho, pra confirmar meu potencial de escolha. mas ao observar melhor começo a ver que ela não se parece comigo e sim com quem, na verdade, eu gostaria de ser, é uma projeção das minhas buscas. e acho até que esse negócio de máscaras não é tão ruim é assim, vejo até que me cai tão bem. então arranco de vez... o rosto que se encontra em baixo dela, pra não parecer assim tão doble.




25 fevereiro, 2008

dia em cores e som



num dia qualquer poderia acontecer. num dia desses, quem sabe. numa esquina com muito verde e vermelho e poderia tocar um som bem limpo e fácil, sem letras audíveis, que acompanhassem o desenrolar da história. calmaria, magia, surpresa, emoção. sintonia de dias, sons, cores, coisas em movimentos e outras em repouso, dentro e fora, na ordem que cair melhor. poderia ser numa sexta-feira ou sábado talvez, pra assim apagar a falta de jeito que foi aquela semana, salvar o que os dias tinham sido até ali. mas sem pressa, sem esperar que fosse o dia e lugar, pra que as expectativas não estragassem, pra que o olhar soasse natural, sem ensaios, nem idealizações, como se fosse um momento comum e ao mesmo tempo não, como se realmente tivesse que acontecer, não importasse as esperas. o coração bateria no compasso daquela música, que ainda tocava e talvez até tivesse vontade de dançar e por pouco que fosse não resistiria. não se preocupar de repente em dar nome ou tamanho a nada, medir, calcular, não se importar com o contraste das cores, nem com formas, olhares, nada além de um metro de si mesmo pra todos os lados. e dentro viver cada segundo sem se dar conta da falta de espaço, falta de tempo, falta de ar, que até suspeitou ser o problema. todos deveriam ter o dia do acontecer do sonho. sonho acontecer.

antes de sair de casa pensou muito que roupa vestiria (verde? vermelho?). se vestiu e saiu de casa achando aquele dia tão comum, pensou até se seria esse o dia. e saiu... assim de azul.




24 fevereiro, 2008

tempo..

que esse dia iria passar era certo, as horas já se mostravam em despedida, era o mínimo a esperar. e amanhã seria um dia tão anterior, tão ultrapassado e vencido, porque de certa forma a vida corria agora ao contrário, na direção errada ou talvez, por meu engano, fosse realmente essa a certa, pois o amanhã não faria sentido algum se tudo o conduzia somente as lembranças, ia sim viver profundamente a esperá-las, depois disso não se sabia o que viria... ou o que foi.

ele vivia ao contrário.

não sabia se o futuro, ou aquilo que chamava urgentemente de passado, traria alegrias semelhantes, só sábia que certa vez no passado, ou aquilo que chamava tão esperançoso de futuro, tinha sido assim. sabia sim, ou sabia vagamente, ou só suspeitava.. ter um dia que admitir não ter acontecido era o que mais temia. era por isso que achava o tempo tão injusto e seco, tão precipitado e cruel, pois ele só precisava passar pra poder mascarar tudo. só o momento exato sabe o gosto que tem, depois você só acha sabores parecidos e pensa que é igual.

foi por isso que vendeu todos os relógios da casa num brechó e pensou um dia encontrá-los sem nunca ter sido usados numa loja de luxo. agora tinha o tempo em suas mãos.



15 fevereiro, 2008

salada

a vida dá seus rumos. (você ainda espera aquele telefonema). o mundo dá seus giros. (da próxima vez quem sabe). os livros dão seus finais. (o projeto não saiu do papel). os tribunais dão seus veredictos. (a carta fica pra amanhã). os médicos dão seus diagnósticos. (segunda-feira você começa). as histórias dão seus vilões. (você fica horas na frente da TV). alguns dão seus jeitinhos. (você acordou ao meio dia). aquele seu amigo arrumou um emprego. (você nem sequer arrumou a cama). os passos dão suas seqüências. (você nem sabe que dia é hoje). as experiências dão suas respostas. (você quer ser um vegetal). a vida dá seus rumos. (a vida dá em você). o mundo virou uma horta.

[o pulso ainda pulsa?]

vai um energético aí?

13 fevereiro, 2008

era o seu gesto




não gritaria aos quatro ventos minhas mágoas. nem que fossem quinze, três e meio, sete ventos. nem que eu apenas suspirasse, ao invés de gritar. não esperaria que o vento se arrastasse levando minhas frustração na direção que eu penso justa. ele pode simplesmente não se dar por satisfeito e correr na direção contrária, trazendo tudo de volta. não adianta varrer pra de baixo do tapete.

você sabe o momento que custou, que se deu demais, esperou, perdeu o ar, o chão, a fala, a hora. lembra que se encostou num canto qualquer se apoiou em qualquer coisa, se condicionou a outras, esperou respostas..

[...]

a criança já andava. começou com alguns arrastados que de leve pareciam meio toscos, era sua forma de improvisar, soava bem a uma grande tentativa. logo começou a engatinhar, mesmo que carregasse em seu coração [tão inexperiente] a vontade de correr, pular, desfilar, mas teria muito que aprender e ousar. mas mesmo a uns bons tombos conseguiu, mesmo que insegura, dar seus primeiros passos. já tinha experimentado tudo isso.. superado isso tudo. o importante é que agora ela andava. e a criança tinha aprendido, mas talvez porque era realmente necessário, outro motivo ao certo não se sabe.

vou te dizer. era imprescindível mesmo. mas ela não iria faze-lo só. ela tinha um pai. ele tinha uma filha. e era mais que isso que os uniam. existiam um amor que olhos não entendiam.


sabe, a criança, como qualquer outra, tinha em seu pai aquele algo superior. e ele realmente o era. ela andava... com ele ao seu lado e andava.. pegava no cós de sua calça e andava. esse simples gesto fazia a sua diferença, pois quando segurava em seu cós podia ver o que se passava ao seu redor tranquila, pois sabia que ele estava ali. eram muitas as coisas que se passavam, eram várias as cores e tão atrativas, era tanta beleza externa, tantas coisas que se atreviam em seus olhos. mas seria arriscado demais trocar a segurança do cós pra poder tocá-las, experimentá-las, ver o que por dentro era. que gosto teriam? mas ela deveria ficar ali. não correr o risco de perdê-lo de vista. poderia não saber mais como voltar. ela tocaria somente no que seu pai lhe desse. e você talvez não saiba, mas eram nessas coisas que se encontravam a verdadeira beleza. era ali que existia. secretamente.


[quando eu me sinto insegura é porque soltei o cós]

Ah! há muitos que vocês precisam saber





vai um amor novinho aí? em grandes porções..




11 fevereiro, 2008

gavetas e lixeiras



guardar os dias em gavetas pra mantê-los semi-novos. e em cada oportunidade fica o medo a roubar-lhe a cena. sentado enquanto passa um filme a sua frente. e vai se perdendo em larga escala todo o rascunho dos livros que seriam colecionados. em cada lembrança ainda fica a sombra do que poderia, enfim, ser a história. e ela seria contada e repetida e lembrada e relembrada... até sobrar a verdade de saber-lhe cumprida. e tempos passariam... e talvez se esqueceria... ou então se saberia de ter sido mais que o sonho de alguém.



[não se acomode demais nas poltrona!]

06 fevereiro, 2008

aiai

de nada me serve o em vão
pois tudo que passa fica também aqui
eu colho e trago e levo
admiro, distraída como de praxe
e me escapam nesses meus sorrisos fáceis
aiai



[uns chamariam isso de fuga. eu chamo de conforto]


.



mais uma almofada?

01 fevereiro, 2008

uma história comum, naturalmente


a vida que sonhou não é a que teve. na que teve nunca ousou. nos seus sonhos, porém, era tudo muito diferente, era sobretudo o que mais queria. seus medos e remorsos, as palavras ensaiadas antes de dormir, nunca saíram de lá. o travesseiro sabia os sorrisos que deixava escapar. ah se acontecesse! acordar era o que mais temia. talvez um dia chuvoso lá fora. talvez ninguém ligasse. talvez a sala vazia. talvez ninguém entendesse de novo.. ou pior: ignora-se [ninguém nunca liga pra isso menina]. mas com o tempo aprendeu onde se refugiar. aprendeu onde ela conseguiria ser quem sempre quis, aprendeu onde encontraria quem desejasse a hora que fosse, que poderia ter a estação que quisesse [ser a estação que quisesse] e ter o fim que lhe cabe. e por que não fazer disso seu abrigo permanente? então soube formular seu mundo tão rápido em sua mente, de uma forma que jamais se achegaria a alguém com tal agilidade, precisava preparar bem o lugar. e foi assim que começou a arrumar a mala, e colocou tudo o que tinha, viajaria pra bem longe: pros seus sonhos. iria substituir as pessoas, criar seus próprios diálogos, fazer dos pequenos os grandes detalhes. e foi a atitude mais radical que conseguiu alcançar em toda sua vida. e era feliz assim. embora ninguém soubesse..



[seria essa a mesma menina dos pontos?]


os sonhos não fazem as flores crescerem..
mas faz a gente crescer... ou estancar, isso dependendo da distância que seus pés estão do chão. cada um conhece seu próprio limite. o tempo de pouso e de levantar vôo.. mas querer é mais quinhentos.
se não se sabe que sonhar é também uma sala de espera, não um esconderijo. é preciso saber voar.



vai uns biscoitinhos aí?

30 janeiro, 2008

sem pôr os pontos nos i's



e juntando todos os pontos, não deixou um sequer esquecido, pegou os do ‘i’ e também do ponto final... e estes também levou! pois lhe ensinaram um dia que as coisas era feitas de linhas, não de telefone, nem de crochê, mas aquelas feitas de pontos. o ponto então seria incrivelmente o princípio, a matéria-prima de tudo na terra, no universo, na vida e todo o resto. e só. pois com os pontos se criam, se inventa, se constrói, como tijolos arquitetamente posicionados até se formar seja lá o que for. e então colocou-os, arrumou-os. onde bem quis. porque quis fazer um mundo. diferente tirando. e colocando e transformando. em coisas. qualquer que talvez. nunca existiram.


[com quantos pontos são seus sonhos?]


vai um café aí?

28 janeiro, 2008

acomode-se



se as letras te inspiram; se as frases que você encontra[ou te encontram], você as guarda para o momento que a merecem; se você busca a magia das palavras em cada pedaço que se encaixa; se você as saboreia e busca o seu valor; se você as testa em várias ordens, de todas as formas, pra buscar a que ninguém nunca ousou fazer; se você ao ler uma história que gosta sente inveja e pensa porque não foi você quem a escreveu; se você se faz letra, se faz livro, se faz filme... e de repente quer ser construído, modificado, inventado, folheado... você é um pouco como eu.
mas penso que não me cabe aqui. não sou nem grande, nem pequena. e não me cabe porque não sei com quantas letras eu sou.
a minha história se mistura com as que leio, crio, improviso, que pego em emprestado... e são essas que vão seguir aqui... com pouco ou nada de mim... até onde eu conseguir convence-los.


puxe a sua poltrona e acomode-se, pois me revelo aos poucos.


vai um chá aí?!